terça-feira, 10 de abril de 2012

Unanimidade e inteligência.


Acho que todo mundo já ouviu alguém citar Nelson Rodrigues, dizendo que "toda unanimidade é burra". Gosto muito deste dizer e sou um pouco partidária esta opinião. Claro que a gente deve evitar generalizações e me alegro em poder dizer que as excessões a esta regra são sempre surpreendentes.

É sabido que quando um músico ouve música, o buraco é bem mais embaixo. Não só pela exigência com as questões técnicas que é fruto do conhecimento de causa. O ego do músico é grande parte do seu ouvido. Muitas vezes, quando um músico ouve alguém que considera inferior tecnicamente ou artisticamente, rola um "regozijo" por estar em melhores condições. Por outro lado, quando o músico ouve alguém que considera superior, pode até virar fã - mas sempre bate aquele "ciuminho" de não ter atingido aquele nível. Obviamente, as comparações são bem piores quando se tratam de músicos que disputam o mesmo espaço, ou seja: uma cantora tem muito mais ciúme de uma grande cantora do que de um grande saxofonista, por exemplo.

Sei que existem músicos benevolentes, pacíficos, amorosos e que querem somente compartilhar a sua música. Mas a competição faz parte do nosso meio e eu acho que ela faz crescer, sempre. Se não fosse a competição entre músicos, não haveria Pet Sounds nem Sargent Pepper's Lonely Heart Club Band, dois álbuns memoráveis de bandas "rivais".

Perdi esse tempo todo falando sobre rivalidade porque, para mim, a questão da unanimidade tem muito a ver com isso. Primeiro, porque o que é unânime não tem rival. Segundo, porque eu sou o tipo que sente "ciuminho" das unanimidades. Sempre que leio por aí na imprensa especializada muitas matérias sobre alguém novo que é considerado "a melhor banda de todos os tempos da última semana", tenho uma implicância das boas. Sei que apesar da mudança de cenário na música, com a força das produções independentes e dos públicos alternativos, ainda tem muito dedo de gravadora na hora de escolher o que ouvimos e o que é considerado (como minha irmã diz) o último grito da moda.

Quando ouvi falar do Criolo pela primeira vez, minha rabugice falou alto. O cara foi citado pelo Chico Buarque (outra unanimidade) em um show e se tornou o mais novo gênio do cenário musical. Apesar da minha implicância, fiz questão de ouvir o disco inteiro para comprovar se essa não era mais uma daquelas mentiras contadas muitas vezes até se tornarem verdade ou se o cara era tudo isso mesmo.

E qual não foi minha surpresa ao ver que ele realmente tem muito conteúdo? Achei um intérprete versátil, um disco muito bem produzido, com referências musicais e textuais que remetem a coisas que acho muito inteligentes e importantes. Eu sempre fui fã do Gabriel o Pensador e desde que ele parou de produzir discos, me senti meio órfã. O Marcelo D2 nunca preencheu essa lacuna porque apesar de sua "busca pela batida perfeita" ser uma empreitada louvável, acho seu discurso muito monotemático. O fato é que o Criolo me ganhou com o groove da primeira faixa do disco e terminou de me conquistar falando mal de São Paulo. Depois vi alguns vídeos ao vivo, e acho que ele pode melhorar como cantor (só pra não deixar o ciuminho totalmente de lado) - mas o disco é primoroso.

No final das contas, fico feliz em saber que unanimidade pode estar aliada à inteligência. Afinal, quando num futuro muito distante eu for uma unanimidade, eu não vou me achar burra.

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